sábado, 15 de dezembro de 2007

FRENESI OCEÂNICO

Conto de Vanessa Morelli

Era tarde da noite, passava das vinte horas, e Marcela, não conseguindo permanecer em seu apartamento visto que o calor se fazia insuportável, resolveu descer para refrescar a mente e seu corpo que por pouco não se desfazia em suor. Colocou então uma roupa aparentemente fresca, foi até o corredor e apertou o botão prateado do elevador. Trinta segundos depois a porta abriu, Marcela entrou. O tempo parecia interminável dentro daquela caixa que era um cubículo, apertado e nada arejado. Finalmente chegou ao térreo. De sua testa, gotículas escorriam, no que Marcela, como se movida por um tic nervoso, passava a mão para se secar.

Ainda lembrou de falar com o porteiro sobre um assunto administrativo e reclamações sobre a infra-estrutura do prédio. Porta afora do Edifício Ipanema, Marcela apressava os passos numa atitude não racional. A lua se fazia intensa. Era noite de lua cheia. Lembrou que não levava seus documentos e nem dinheiro para qualquer possível eventualidade, mesmo assim foi com propósito e convicta de suas intenções. Prosseguiu seu caminhar. Mais forte, mais rápido! Seguia para o objetivo com tanta sede como se procurando algo desconhecido. Caminhava ardente e compulsivamente.

Não havia nenhum ventinho, nenhuma sombra de vida humana no percurso, o que fazia com que Marcela se encontrasse entre sonho e imaginação. Seria real o que estava vivendo? Como um tormento, o tempo parecia não mais existir, tal foi o seu desespero. E avistando algo na linha do horizonte, pôs-se a correr. Correu como uma criança que acaba de ter seu desejo satisfeito. A brisa! Deliciosa brisa embriagadora de sentidos! Quem dera pudesse sentir este prazer incandescente para todo o sempre.

Com um sorriso ingênuo flertou a imagem. Que bela imagem! Trouxe à memória seu agradecimento a alguma poderosa divindade pelo prazer excitante que essa lhe permitia. Mexeu nos cabelos.

A sensação de euforia era tanta, imensurável. Era ele! E como a chamava! De tal maneira que, hipnotizada pela sonoridade, seguiu descontrolada. Ouviu seu nome:

- Marcela...

Continuou correndo e o vendo adentrou em suas águas. E havia uma textura - grãos de areia. Tais cristais se faziam sentir nos seus pés já descalços e mergulhou numa alucinação desesperada de dor. Lembrou-se de relatos de náufragos, histórias de marinheiros, sobreviventes e até de Iemanjá. Contemplou durante longos minutos a suavidade e agressividade das ondas a percorrer e transpassar seu corpo. Sentiu-se invisível e assim mergulhou. Mergulhou! Pensava: “Seguirei a linha do horizonte sem parar”.

Em repetidos movimentos mecânicos, borboleteou, maripousou e sapeou mar adentro. A água era fria, mas juntamente com a inconstância do mar, seguiu bravamente a linha do horizonte. Belo mar de águas esplendoras sem fim...

Marcela, num contínuo movimento, ia com um único propósito: seguir adiante e sempre em frente. Adiante! Em frente! Sua ambição era longa, seu desejo, uma ordem. E Marcela prendia o ar e ia, ia... Quando a dor a atingia, respirava e afundava novamente.

Como num transe, sua obstinação a guiava, sua persistência a motivava e sua teimosia exigia: Vamos, em frente! Seu instinto a alertou. Marcela não temia. Avistou a ilha. Faltava pouco. Adiante!

Gotas dos céus começaram a cair, confundindo o olhar de quem se encontra entre o ar e o mar. Posêidon levantava seu tridente e lançava seu furor: uma tempestade. Golfinhos aflitos subiam e desciam, confusos pela mudança repentina do seu ambiente. Marcela prosseguia. Não estava longe, faltava muito pouco. Num estado de êxtase absoluto, acelerou seus movimentos não mais tão precisos. Seu esgotamento físico era evidente, mas continuava. A escuridão era acentuada, a Lua não estava mais tão clara, mesmo assim Marcela não desistiu. E num mergulho infinito, Marcela soltou um leve suspiro. Criaturas marinhas eis que surgiram e entre suas nadadeiras, percebeu-se sereia.

By Vanessa Morelli ®
Conto devidamente registrado na Biblioteca Nacional.

MARGARIDAS - Montagem 2008?

A Camila Sartorelli é a produtora de Margaridas (2007), texto de minha autoria. Este mês formatou o projeto para entrega da concorrência dos teatros distritais. Vamos saber da aprovação em janeiro de 2008. Até lá, ficamos nós a torcer. CIA 011 (última reunião 12/12/07)

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Um tercinho (inédito) de um poema de Lunna Montez´zinny Guedes

Há no silêncio dessa janela
...estrelas, luas e metáforas inquietas
Há a meditação insensata
Uma palavra que pulsa
Sensações que se acumulam no teclado
Na tela, outrora em branco
Versos dançam na frente dos olhos

A vela ilumina a mesa
...a xícara guarda o último gole
E sobre a mesa - sombras oscilam
A palavra. Minúscula.
Ignora o que não é noite!
E ali - nos braços da madrugada
A poesia...
Me chamava!


*** Não foi ainda publicado em canto algum, está estreando aqui no meu Blog. Não é emocionante?

Um começo, uma postagem...

Como todos devem saber (ou, muito provavelmente, nem todos), possuo um blog no Spaces do Msn chamado SerendipityArtes, do qual muito raramente publico textos meus para leitura virtual. Ok. Estava eu muito satisfeita com o meu Blog quase nunca acessado, até que um belo dia (hoje mais especificamente) a minha querida amiga Lunna Guedes me pergunta porque não abri um Blog no Blogger. Sem resposta, cá estou. Por que não?
Não faço ainda a menor idéia das águas divisoras de um e de outro, não importa.
Espero que consiga me expor cada vez mais via internet porque sou "podadora" de pensamentos meus. Merda, sucesso e sorte a todos neste ano de 2008 que está pra dar início.



SOLO-ANDANÇA
Autoria: Vanessa Morelli

Feliz aquele que anda pelos caminhos da vida na ignorância. Feliz daquele que cultiva um sonho eterno da busca, sem feridas, sem mágoas, mas com comprometimento. Feliz do outro que segue seu caminho sem se questionar com o que vem pela frente. Feliz, feliz, feliz o outro, eu e aquele que não segue o fluxo, mas busca uma reflexão.
A maior parte do tempo percebo que nada consegue explicação clara, embora tudo – TUDO - exija uma explicação. Não minha, não sua, mas uma razão.
E foi assim, hoje ainda é esse fluxo continuo de busca. Para onde vou? Caminhar pelas retas da estrada, andar nas curvas ou subir-descer, enfim... o que fazer?
Dia comum, como todos os outros, dia simples e extenso como todos os dias e a minha visão era essa:
Deparo-me com uma escada. Há uma espécie de poeira branca que não consigo identificar. Parada, fico olhando por alguns instantes, absorvida pela falta de contexto. Essa poeira forma um desenho nos cantos da escada, na altura da parede. Não é poeira de tinta, não há sinal de que fora lixada. Desisto. Subo degrau por degrau. O caminho não é longo. Chego numa parte plana, pequena, e virando à esquerda tem mais uma escada. Ponho-me a subir. Primeiro, segundo, terceiro degrau e assim por diante. Em frente, uma porta fechada. Não ouso abrir. Não abro. Novamente à minha esquerda uma nova escada um tanto tumultuada de sacolas fechadas. Acostumo-me e subo novamente. Uma porta entreaberta à esquerda, seguindo reto há um corredor. Um tipo de grade bloqueia o caminho. Consigo abrir e continuo andando. Chego num quarto bagunçado. Roupas espalhadas por todos os lados, uma televisão ligada falando sozinha, não existe telespectador. Um espelho na porta do armário chama minha atenção. Coloco-me à sua frente. Surpreendo-me. O que vejo não é minha imagem, mas uma cama vazia, abandonada, pedindo pra não ser vista.



CONTRA A MARÉ

Suspensa no ar
Ardendo no fogo
Plantada na terra
Respirando na água
Turva nos quatro elementos.

Ser humano tão complicado
Ser andrógino tão neutro
Ser inconstante tão voraz
Ser e ao mesmo tempo não ser
Nada ser por fim.

Tac tac pum! Poom!
Caiu! E o que restou?

Vermelho verão
Mão, corre a mão
no corremão
Não, senão verde
Verde as cores
do verão
Sinal verde,
na contramão.

By Morelli ®


Nostalgia

Olhava a lua e achava mágico
Traçava uma reta e mesmo assim havia emoção
Contemplava as estrelas e me espiritualizava
Beijava o amado e acreditava em casamento
Fazia amizades e tinha fé na sinceridade
Comia e não engordava
Escrevia e me purificava
Rezava e possuía o dom da devoção
Pintava e me achava uma artista
Sonhava e pensava em ser atriz
Cantava e me encantava
Jogava e me jogava
Admirava e me admirava
Respirava amor e dava a vida
Doava e me perdia...

By Morelli ®


A Tormenta

Atormenta acordar e saber dormir
Atormenta saber sentir e sentir saber
Saber que se sente atormenta
A tormenta atormenta
Atormenta viver e viver reviver
O que atormenta, a tormenta
Ator, menta, menta, ator, atormenta
Atormenta fingir e viver fingir
Fingir que atormenta a tormenta.

By Morelli ®



VIAGEM NATURAL
* faz parte de um trecho
da minha primeira peça*

O brilho das estrelas não ofusca o brilho da lua,
redonda, imperiosa, majestosa,
ela é só ela, única!
Porém existe o sol,
mas é preciso desaparecer um para dar espaço ao outro.
Um precisa ceder.
É necessário desaparecer,
mesmo que por um dia
e mesmo assim existe lua,
existe sol.
Um sabe do outro,
mas não se conhecem
e nunca pediram para se conhecer.
E existe ar, existe oxigênio.
E existe água,
mas é necessário hidrogênio,
dois hidrogênios para estar ao lado do oxigênio.
E três se unem, não são dois, nem quatro.
São três.
Três é sempre bom, nunca é demais,
dois talvez sejam dois por serem demais
e um é pouco, sempre é pouco,
mas ao lado de dois hidrogênios é sempre bom.
E existe a água, os três necessários.
E há relação, a três,
mas há uma e somente uma relação.
E a terra é seca, úmida e nunca deixa de ser terra.
Pode ser lama.
Algumas lamas fazem bem a pele.
Contato de peles,
e se esquentam
e se arrepiam
e pedem abrigo
e sentem carinho
porque há calor e aquece,
aquece e pega fogo,
que queima, arde e alimenta,
mas é necessário respirar e existe oxigênio,
oxigênio que se une a dois hidrogênios,
mas é necessário oxigênio,
é necessário respirar,
Ó DOIS!

By Morelli ®


Mulher

Mulher felina
Agressiva e dengosa
Tece seus caminhos
Infinitos e cheios de brilho
Firme e astuciosa
Vaga soberana
Desertos e concretos
Crê em sininhos
Típicos sons soníferos
Despertam senhoras.

Não tem medo
Acredita em beleza
Serena e esbelta
Veste sua coroa vermelha
Canta ao luar
Inspira-se em si mesma
Reflete magia
Rica por ser teor
Límpida como orvalho
Sensibiliza a natureza.


Estúpidas criaturas


Afagavam-se
Beijavam-se
Sentiam o calor dos corpos
Trêmulos e inquietos
Acostumavam-se
Não se viam
Quando se sentiam
Satisfaziam-se mesmo
Vazios Vagavam
E para sempre a esmo


Encontravam-se casualmente
Era conveniente
Marcavam encontros escondidos
e rápidos
Não tinham obrigações
Estavam perdidos, sem noções
Para sempre insatisfeitos
Julgavam-se ligeiros
Mal sabiam o que procuravam
Porque nada mais era do que eles mesmos


Quanto ego!
Quanta ignorância!
Achavam-se espertos
Arrastavam-se em córrego,
Procurando fragrância
Encontravam-se dispersos
Rente a calçada, pertos!
na ânsia da loucura,
Remavam e exaustos
Contra a cura.


O mel virou fel
O dia anoiteceu
E entre passos
Caminhavam réus
Não houve um anel
O amor amorteceu
Desnorteou compassos
Caídos dos céus
Jogados sem tônus
Pousaram nus.


Não houve esperança
O casal soluçou
Dissolveu temperança
Resmungou, abraçou
o nada hesitante
Destronados dos sentidos,
soluços sentiram
Incompreensível mistério rasante
Enjaulou gemidos
Tão suaves, explodiram!


***


Era para ser uma história de amor
Daquelas que vibram até estátuas
mas como todo ego apaixonado gera tumor
Não houve nada mais do que mãos tuas.

Visões distorcidas correram infinitas
Buscando abrigo num espírito consolador
Embaraçadas, traçaram palavras ditas
De uma grande dor transformada em ardor.


By Morelli ®